Corta o cabelo II

          Estive a olhar para o passado e fiquei com nostalgia e vontade de volta ao momento de viragem, o momento de mudança, de cortar o cabelo curto e avançar com a vida, diferente e mais leve. A sensação de que por muito que tivesse ficado para trás haveria sempre novas aventuras, descobertas e esperança. A sensação de que me consigo reinventar a cada passo e volta e que não fui derrubada, não me deixei ficar. E tenho vontade de o fazer novamente - cortar o cabelo como quem corta o peso dos arrependimentos e como quem deixa a dor para trás. É que ultimamente a dor tem-se agarrado a mim como tentáculos pegajosos que não despegam, mas pesam e me arrastam. É que nestes meses tem sido difícil dar passos sem calcular ou pensar ou analisar demasiado, sem duvidar de mim mesma. É como se, de repente, tivesse acrescentado um peso ao meu peito e às minhas pernas, que me dificulta a caminhada.
          Mas desta vez não quero sair de mim mesma, não quero destruir quem fui ou deixar-me para trás. Porque eu sou aquilo que vivi e fui eu que me construi, e tenho orgulho em mim, tenho orgulho em quem sou. Desta vez quero 'simplesmente' crescer, acrescentar mais uns centímetros a quem sou agora, e avançar para a próxima fase, para o próximo passo, para a próxima aventura ansiogénica. Quero permanecer.
          Então o cortar o cabelo já não será um corte com o passado, mas uma forma de me aceitar, de olhar para o que fiz, o que aconteceu, e aceitar que posso mudar, ser diferente e avançar, mas que continuarei a ser eu, com tudo aquilo que construi e com tudo aquilo de que me orgulho.
Então corto (cortarei) o cabelo, não para me mudar, mas para me lembrar que está tudo bem, e que posso avançar.

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